De olhos bem abertos

Só saiu no Estadão e no Último Segundo, e vale ficar esperto: a prefeitura estuda dar fim ao bilhete único em São Paulo. Aqueles estranhos que governam a cidade dizem que as gratuidades “sufocam” o setor de transportes. Engraçado o argumento, e pior ainda a solução, tendo em vista que, também segundo o Estadão, o passageiro arca com 86% do custo do transporte coletivo na cidade —porcentual bem superior ao de Paris, por exemplo: 33%.

Se temos uma das maiores cargas tributárias do mundo, fica a pergunta de sempre: o que essa gente estranha anda fazendo com nosso dinheiro?

Legal uma iniciativa de Belo Horizonte, que está usando a Internet para aproximar reles mortais como nós das decisões políticas. Pelo site http://opdigital.pbh.gov.br dá para ver as obras propostas pelo Orçamento e votar nas que julga mais úteis. Um belo exemplo de democracia digital.

Jesus, ele me conhece


O Ministério Público pediu hoje a prisão dos fundadores da Igreja Renascer, Estevam Hernandes Filho e Sônia Haddad Moraes Hernandes, noticia a Folha. Sim, a Sônia Hernandes, bisba dos gideões, que vive na TV.

Inevitável lembrar da música “Jesus, He Knows Me“, do Genesis, ao visitar o site da Igreja. Além de vender ringtones (sim, toques para o celular), possui um pop-up com a foto de Estevam e Sônia. E eles aceitam Visa.

Bancos patrocinadores e jornalismo distorcido

Diz o Manoel da Folha que o jornal deve ser pluralista, apartidário etc. Interessante ver como o diário paulista coloca isso em prática em sua manchete de hoje —Bancos doaram R$ 10,5 milhões à campanha de Lula.

Stop. Como isso soa? Denúncia, certo? Leva o leitor a pensar: “Nossa, descobriram mais uma coisa podre na campanha do Lula… que canalha!” E como o brasileiro médio —sim, o Homer do Bonner— não tem o hábito da leitura, sai dessa leitura rápida acreditando na Veja, no Papai Noel e na indústria de consumo norte-americana.

Impressionante chegar ao segundo parágrafo da notícia e descobrir que o candidato Geraldo Alckmin, do PSDB, recebeu exatamente a mesma quantia dos bancos. O que há de errado então que Lula tenha recebido R$ 10,5 milhões? Por que o título da reportagem não incluiu os dois? Não seria mais correto, do ponto de vista jornalístico?

Censura liberada no Orkut

Cheira estranho a relação entre Google e Justiça brasileira. Primeiro vieram os rumores sobre possíveis restrições e até a saída do Orkut do Brasil. Agora o próprio Google que diz primar pela privacidade de seus usuários —e por isso fez tanto barulho para não abrir dados específicos requeridos pela Justiça— cria uma ferramenta de censura para a Polícia Federal.

Tudo bem, o tal do “Estado de Direito” dá a entender que um órgão como a Polícia Federal existe para me defender. Mas disso a poder bloquear contas sem precisar de determinações judiciais, será que não foram longe demais (Google, pela permissividade; PF pela autoritariedade)?

Conteúdo gerado por usuários

A Internet é cada vez mais palco para conteúdo gerado por usuários. Haja vista os milhares de blogs (como este) e sites como YouTube. Mas essa história de colaboração ainda precisa de uma cara.

Hoje o Terra chamava um vídeo do VC Repórter em sua capa: “veja a chuva em São Paulo“. Um texto como esse cria a expectativa de que você seja apresentado a “várias chuvas”, que fale-se dos principais pontos de alagamento, ou que conte-se o que a chuva causou em alguns trechos da cidade.

Qual não é a surpresa a abrir o vídeo e se deparar com imagens da janela de um internauta. Ora, eu mesmo vi a chuva de minha janela ontem. Para que preciso assistir o vídeo do Terra? Será que entramos numa espiral de preguiça?

Eis talvez um dos enganos que ainda existem sobre a tal colaboração, quando se trata de jornalismo. Desde quando admitir que cada um tem um ponto de vista e uma “verdade” virou argumento para que aceitemos uma produção limitada e parcial como “reportagem”? Só porque produções assim são “empacotadas” e “rotuladas” como tal?

Como todos os portais (Globo, iG, Terra e UOL) moderam conteúdo, não dá para falar em colaboração. Essa prática de receber contribuições de leitores já existe há muito tempo —inclusive como forma de cortar custos. Recentemente também surgiu a tal Sou + eu, da Abril, revista em papel feita com conteúdo de leitores. Mas tudo isso ainda é “mainstream”, não é a colaboração que existe lá fora.

Desta forma, além da espiral da preguiça, a colaboração digital ainda corre o risco de não sair do mainstream no Brasil. E corremos o risco de que a Internet engatinhe como veículo democrático e subversivo, coisas que a TV e o rádio comunitários poderiam ter promovido, mas que as elites políticas (e econômicas) alinhadas ao governo tão bem fizeram desde o início do período republicano.

O gordo e o magro

Interessante a abordagem da revista CartaCapital ao tema da nutrição na edição desta semana. Em vez da mera exploração da morte da modelo anorexa capa da Veja e da IstoÉ, a revista aborda como o país chegou e convive com o contraste entre desnutrição (a vulga fome) e obesidade. Vale a leitura.

Contracultura de massa

Eis que estreiou no Brasil em outubro a versão tupiniquim da revista Rolling Stone, um dos ícones da cultura pop norte-americana. Eis que o editorial, todo engajado, fala da contratultura. Só não deu para entender se a Gisele Bündchen na capa era ironia (ou pura contradição). É a “rebeldia” vendida em lata, a contracultura do espetáculo, a oposição tirânica da cultura de massa.

Enquanto isso, do outro lado da força, permanecem indecifravelmente chatas as Piauís e Caros Amigos… para onde vamos, Foucault?